Tentei gritar, mas o sangue transbordou por minha boca.
O maldito corria muita a frente, com a bolsa balançando ao seu lado. Mas deixou, além de gritos grosseiros, uma faca cravada em minha jugular.
"Otária, por que foi tentar reagir?"
"Otária"
"Otária"
"Otária"
Os joelhos tornaram-se fracos, e meu corpo cedeu para frente. Com a queda, senti a faca penetrando mais e mais, destroçando toda minha placa óssea, minha clavícula.
Engraçado; espancada, cortada, fraturada, e eu estava morrendo afogada. Afogada em meu próprio sangue.
Gostaria de ter ouvido harpas, mas todo o som do mundo sumiu, dando espaço a um seco som de pedra quebrada, de chão se partindo. Uma mão magra desvirginou o novo espaço, seguida por um braço em terno cinza risca de giz. Em pouco, um homem magro estava parado, encarando-me.
Logo acima de sua gravata verde limão, um cavanhaque comprido finalizava o fino perfil de seu rosto.
O Tinhoso sorriu. Caminhou em minha direção à passos lentos. Pegou-me em seu colo e murmurou em meu ouvido:
- Vamos, querida?
Olhei no fundo de seus olhos sem pupila, sem íris; poços leitosos de desolação e sofrimento.
- Não - respondi calmamente, e cravei minhas unhas em seu rosto, rasgando pele e olhos.
Ele urrou de dor e me largou, enquanto meus dedos se embebedavam em viscosidade sanguínea.
Bati com o ombro no velho ah minha frente, e com um balançar inútil, seu corpo caiu na fenda recém aberta, voltando para a escuridão.
Olhei para baixo; não havia faca nem ossos fraturados. Apenas sangue e roupas rasgadas.
Baixei os olhos, para a fenda, e mostrei o dedo do meio. Olhei para cima e repeti o gesto.
- Eu vou viver, babacas - E após dito, caminhei a passos calmos na direção do ladrão.
Hoje a noite alguém iria sofrer muito.
- Dedos Azuis
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