quarta-feira, 8 de maio de 2013

Real


Batucava os dedos no chão de mármore frio quando a madeira da porta rangeu, e com um grito silencioso arrancou minha paz.

Minha cabeça latejou instantâneamente, e a sensação de vazio se apoderou de todo meu pequeno corpo. Meus dedos esfriaram, minha garganta secou.

Parado, na soleira, meu avô me encarava. Com uma máscara de dor atravessando o seu rosto como uma cicatriz de guerra, as mãos grossas e calejadas desabotoando as calças, ele pigarreou. Não algo para eu entender. Não. Não nos comunicávamos, a não ser pelos breves ruídos e grunhidos que emitiamos um para o outro.

Ele deu um passo para a frente, em minha direção. Ao longo dos anos de sofrimento e dor, minha mente criou uma proteção, um casulo. Minha mente criou Loráx. Meu mundo particular que me acolhia em situações de medo. Bastava fechar os olhos, era só fechar os olhos, e o real se transformava em irreal, e ao mesmo tempo ideal.

Apertei os olhos com força.

Abri. Ele continuava com seus passos mancos em minha direção, deslizando o zíper para baixo. E continuava, continuava. Eu olhei, com receio, mas me lembrei que em Loráx eu era corajoso, em Loráx eu poderia ser meu próprio super herói. Pulei por cima da cama empoeirada, com meus pés descalços estalando no mármore do chão, até alcançar a pequena comoda à direita. Puxei a velha gaveta, e de dentro tirei a antiga beretta de meu pai.

Sem exitar, levantei meu fino braço e apertei o gatilho. Seguinte ao estrondoso rugido de liberdade, o silêncio predominante invadiu todo meu ser, entrelaçado a paz. E por fim sorri; este irreal é tão saboroso que disputa espaço em minha cabeça. Mas era hora de voltar para o real.

Apertei os olhos com força.

Abri. Estava em Loráx.

- Dedos Azuis

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